quarta-feira, 2 de março de 2011

Malandro é o Curupira, que faz Gol de Calcanhar

O leão e a leoa viviam às turras. Brigavam por causa da caça, da limpeza do covil, do banho dos filhotes.

Naquele dia, não tinha sido diferente e o leão saiu batendo a porta da caverna. Andava pela mata dando patadas em tudo que encontrava, urrando para todos ouvirem. Ela lhe dava nos nervos, mandava fazer isso, proibia de fazer aquilo. E ele posando de rei. Roar! Correu muito até se cansar. Deitou-se no galho de uma jaqueira e ficou ali parado, até que desaparecesse a vontade de extrair os pelos dela com uma pinça.

Foi então que um ratinho desavisado passou por cima do galho, carregando o butim de sua campanha num acampamento próximo. O grande felino segurou-o pelos quartos traseiros até quase esmagá-lo, embora não quisesse promover nada rápido demais, nem definitivo. Centrou todo seu ódio no pequeno roedor, gritando: “Criatura insignificante, ralé dos seres vivos, sarjeta da mata. Você é nada, só não o destruo com um dedo mínimo porque você é a escória e eu tenho nojo de tocar suas entranhas e me tornar qualquer coisa próxima de você.”

Nessa hora, o rabinho que o pequeno larápio tinha mergulhado no pote de maionese foi de grande utilidade. Espremeu-se por entre os dedos poderosos da fera imensa e correu para a ponta de um galho frágil, não muito distante. Satisfeito com sua artimanha, pôs-se a galhofar, imitando a voz do leão em sua fala miúda, dizendo: “Eu é que sou o rei da floresta. Você só tem pose, juba e”, esfregando o rabinho, completou, “patas fortes. Mas é burro feito um asno”. Desceu da árvore, correndo desembestado.

Atrás dele vinha o leão irritado e com o orgulho ferido.

Para provar sua teoria da estupidez do leão e, simultaneamente, demonstrar todo o conhecimento adquirido nos inúmeros livros que roera, o ratinho sentou-se sobre uma pequena folha no meio do lago e gritava teoremas pela metade, verbos no futuro do pretérito composto, fórmulas insolúveis, trechos da tabela periódica, nomes de minerais, capitais de países da Europa Oriental.

O leão rugia: “Quando eu te pegar, vou fazer picadinho, sua ameba tagarela!”

Desta feita, o espetaculoso sentara-se no alto de outra árvore e ria com as canjicas de fora. Às suas costas, ouviu um rosnado baixo. Era a leoa, que o comeu de um bocado.

Contradizendo a linha da ficção adotada por autores do século XXI, que afirma que todos os textos contemporâneos que abordam romances terminam em separação ou em um momento rotineiro que permite várias leituras, o casal de leões viveu feliz para sempre.

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